Manutenção da Qualidade de Segurado por ocasião de mal incapacitante

Qualidade de Segurado e Carência

A grosso modo, cada benefício exige o cumprimento de requisitos específicos para que se faça jus ao recebimento, dentre os requisitos mais comuns estão a carência e a qualidade de segurado.

Não é raro que ambos os requisitos sejam confundidos pelo cidadão, visto que seus conceitos são separados por uma linha muito tênue.

O conceito legal de carência está previsto no art. 24 da Lei 8.213/91, e corresponde ao número mínimo de recolhimentos mensais. Vejamos:

Art. 24. Período de carência é o número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício, consideradas a partir do transcurso do primeiro dia dos meses de suas competências.[1]

Já qualidade de segurado é a condição atribuída a todo cidadão filiado a Previdência Social, que realize a contribuição previdenciária nos termos da lei.

Ou seja, para manter a qualidade de segurado, não se exige um número mínimo de contribuições, mas exige-se, sim, que o segurado mantenha-se contribuindo constantemente para a previdência.

No entanto, a simples cessação do pagamento não extingue de imediato a qualidade de segurado, sendo que a legislação determina que, mesmo sem recolhimento, cumpridas algumas condições, esses filiados ainda irão manter esta qualidade, o que é denominado de “período de graça”. Vejamos:

Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:

I – sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;

II – até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;

III – até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;

IV – até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso; V – até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;

VI – até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.

§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.

§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.

§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.

§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos. (grifou-se)[2]

Desta forma, de regra, após a interrupção das contribuições, manterá a qualidade de segurado por mais 12 meses o segurado obrigatório e por 06 meses o segurado facultativo, podendo, assim, se utilizar por mais este período dos benefícios da previdência.

Manutenção da Qualidade de Segurado em Razão da Incapacidade

Diversos são os casos em que o segurado deixa de trabalhar por conta de uma doença que o incapacita para o trabalho mas não consegue comprovar perante o INSS, ficando, assim, desassistido: sem trabalho e sem benefício do INSS.

Passado o seu período de graça, o segurado busca mais informações sobre a possibilidade de pedir benefício por incapacidade ou mesmo outros benefícios da previdência social, no entanto, se depara com a seguinte situação: ele não possui mais a qualidade de segurado, requisito para o benefício que pretende receber.

De acordo com o inciso I do artigo supracitado, verifica-se que aqueles que permanecem em gozo de benefício, não perderão a qualidade de segurado, justamente pela impossibilidade de contribuição (casos de auxílio doença, acidente, acidentário, reclusão, aposentadorias, etc.).

Partindo desta lógica, podemos extrair que aquele indivíduo que deixou de contribuir com a previdência em razão de doença incapacitante também não deverá perder a sua qualidade de segurado.

Ora, embora o segurado não esteja em gozo de benefício previdenciário, está incapacitado para o trabalho e, por consequência, impossibilitado de verter contribuições, visto que não possui renda para tanto.

A jurisprudência majoritária já firmou entendimento de que a ocorrência de moléstia grave incapacitante evita a perda da qualidade de segurado, tendo como base o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, bem como também o art. 1° da lei 8.213/1991 que diz:

Art. 1º A Previdência Social, mediante contribuição, tem por fim assegurar aos seus beneficiários meios indispensáveis de manutenção, por motivo de incapacidade, desemprego involuntário, idade avançada, tempo de serviço, encargos familiares e prisão ou morte daqueles de quem dependiam economicamente. [3]

Vejamos a jurisprudência:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO DO DE CUJUS. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO IMPROVIDO. 1. Esta Corte Superior de Justiça consolidou seu entendimento no sentido de que o trabalhador que deixa de contribuir para a Previdência Social em razão de estar incapacitado para o trabalho não perde a qualidade de segurado. 2. Agravo regimental improvido. (985147 RS 2007/0212459-3, Relator: Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Data de Julgamento: 28/09/2010, T6 – SEXTA TURMA. Data de Publicação: DJe 18/10/2010). (Grifou-se)[4]

No entanto, para que a qualidade de segurado seja mantida, o mal incapacitante deve surgir enquanto a pessoa ainda seja segurada do INSS, pois, caso contrário ela não terá direito à preservação desta qualidade. Vejamos a jurisprudência neste sentido:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS ARTS. 462 DO CPC E 102 DA Lei 8.213/91. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 282/STF. QUALIDADE DE SEGURADO. ACÓRDÃO QUE, EM FACE DA PROVA DOS AUTOS, CONCLUIU PELA SUA INEXISTÊNCIA. […] II. O Tribunal de origem, com base na prova pericial, destacou a impossibilidade de precisar-se a data do início da incapacidade e reconheceu a perda da qualidade de segurado, convicto de que, entre a data do laudo pericial, em janeiro de 1999, e a última contribuição recolhida, em maio de 1996, decorreram mais de 12 meses, inexistindo a possibilidade de a autora valer-se das prorrogações do período de graça, estabelecidas pelo art. 15, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91. Diante desse quadro, os argumentos da agravante, quanto ao surgimento da incapacidade durante o período de graça, somente poderiam ser acolhidos mediante o revolvimento dos aspectos concretos da causa, providência que resta obstada, no âmbito do Recurso Especial, pela Súmula 7 desta Corte. III. Concluiu o Tribunal de 2º Grau, ainda, que “as contribuições recolhidas posteriormente não asseguram a percepção do benefício previdenciário, uma vez que a doença se tornaria preexistente à nova filiação à Previdência Social (artigo 42, § 2º, da Lei nº 8.213/91)”. A recorrente, contudo, não infirmou tal fundamento, capaz, por si só, de manter o acórdão recorrido. Incidência da Súmula 283/STF, quanto ao ponto. IV. Agravo Regimental improvido. (AgRg no AREsp 410.216/SP, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/09/2014, DJe 23/09/2014). (Grifou-se)[5]

Sendo assim, é plenamente possível que haja a manutenção da qualidade de segurado para aquele que esteja acometido de mal que o incapacite para o trabalho, desde que a doença seja contemporânea ao tempo em que a qualidade de segurado teria se perdido, em condições normais.

 

 

REFERÊNCIAS:

 BRASIL. Lei 8.213 de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Brasília, DF, jul. 2018.

 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial. Previdenciário. Pensão por Morte. Perda da qualidade de segurado Do de cujus. Não Ocorrência. Agravo Improvido. Relator: Ministra Maria Thereza de Assis Moura. Julgado em 28/09/2010. DJe 18/10/2010.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial. Previdenciário. Previdenciário. Aposentadoria por Invalidez. Alegada violação aos arts. 462 ao CPC e 102 da lei 8.213/91. Ausência de prequestionamento. Súmula 282/STF. Qualidade de Segurado. Relatora: Ministra Assusete Magalhães. Julgado em 16/09/2014. DJe 23/09/2014.

 

NOTAS DE RODAPÉ:

[1] BRASIL. Lei 8.213 de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Brasília, DF, jul. 2018.

[2] BRASIL. Lei 8.213 de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Brasília, DF, jul. 2018.

[3] BRASIL. Lei 8.213 de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Brasília, DF, jul. 2018.

[4] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial. Previdenciário. Pensão por Morte. Perda da qualidade de segurado Do de cujus. Não Ocorrência. Agravo Improvido. Relator: Ministra Maria Thereza de Assis Moura. Julgado em 28/09/2010. DJe 18/10/2010.

[5] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial. Previdenciário. Previdenciário. Aposentadoria por Invalidez. Alegada violação aos arts. 462 ao CPC e 102 da lei 8.213/91. Ausência de prequestionamento. Súmula 282/STF. Qualidade de Segurado. Relatora: Ministra Assusete Magalhães. Julgado em 16/09/2014. DJe 23/09/2014.

 

Escrito por: Alessandra Mancasz.

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